Negro Drama

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Racionais Mc’s

Negro drama, entre o sucesso e a lama

Dinheiro, problemas, invejas, luxo, fama

Negro drama, cabelo crespo e a pele escura

A ferida, a chaga, à procura da cura

Negro drama, tenta ver e não vê nada

A não ser uma estrela, longe, meio ofuscada

Sente o drama, o preço, a cobrança

No amor, no ódio, a insana vingança

Negro drama, eu sei quem trama e quem tá comigo

O trauma que eu carrego pra não ser mais um preto fudido

O drama da cadeia e favela

Túmulo, sangue, sirene, choros e velas

Passageiro do Brasil, São Paulo, agonia

Que sobrevivem em meio às honras e covardias

Periferias, vielas, cortiços

Você deve tá pensando: O que você tem a ver com isso?

Desde o início por ouro e prata

Olha quem morre, então veja você quem mata

Recebe o mérito, a farda que pratica o mal

Me ver pobre, preso ou morto já é cultural

Histórias, registros e escritos

Não é conto, nem fábula, lenda ou mito

Não foi sempre dito que preto não tem vez?

Então, olha o castelo e não foi você quem fez, cuzão

Eu sou irmão dos meus truta de batalha

Eu era a carne, agora sou a própria navalha

Tin-tin, um brinde pra mim

Sou exemplo de vitórias, trajetos e glórias

O dinheiro tira um homem da miséria

Mas não pode arrancar de dentro dele a favela

São poucos que entram em campo pra vencer

A alma guarda o que a mente tenta esquecer

Olho pra trás, vejo a estrada que eu trilhei, mó cota

Quem teve lado a lado e quem só ficou na bota

Entre as frases, fases e várias etapas

Do quem é quem, dos mano e das mina fraca

Negro drama de estilo

Pra ser e se for, tem que ser, se temer é milho

Entre o gatilho e a tempestade

Sempre a provar que sou homem e não um covarde

Que Deus me guarde pois eu sei que ele não é neutro

Vigia os rico, mas ama os que vem do gueto

Eu visto preto por dentro e por fora

Guerreiro, poeta, entre o tempo e a memória

Ora, nessa história vejo dólar e vários quilates

Falo pro mano que não morra e também não mate

O tic-tac não espera, veja o ponteiro

Essa estrada é venenosa e cheia de morteiro

Pesadelo é um elogio

Pra quem vive na guerra, a paz nunca existiu

Num clima quente, a minha gente sua frio

Vi um pretinho, seu caderno era um fuzil

Um fuzil

Negro drama

Crime, futebol, música, carai

Eu também não consegui fugir disso aí

Eu sou mais um

Forrest Gump é mato

Eu prefiro contar uma história real

Vou contar a minha

Daria um filme

Uma negra e uma criança nos braços

Solitária na floresta de concreto e aço

Veja, olha outra vez o rosto na multidão

A multidão é um monstro, sem rosto e coração

Ei, São Paulo, terra de arranha-céu

A garoa rasga a carne, é a Torre de Babel

Família brasileira, dois contra o mundo

Mãe solteira de um promissor vagabundo

Luz, câmera e ação, gravando a cena vai

Um bastardo, mais um filho pardo, sem pai

Ei, senhor de engenho, eu sei bem quem você é

Sozinho cê num guenta, sozinho cê num entra a pé

Cê disse que era bom e as favela ouviu

Lá também tem whisky, Red Bull, tênis Nike e fuzil

Admito, seus carro é bonito

É, eu não sei fazer

Internet, videocassete, os carro loco

Atrasado, eu tô um pouco sim

Tô, eu acho

Só que tem que, seu jogo é sujo e eu não me encaixo

Eu sou problema de montão, de Carnaval a Carnaval

Eu vim da selva, sou leão, sou demais pro seu quintal

Problema com escola, eu tenho mil, mil fita

Inacreditável, mas seu filho me imita

No meio de vocês ele é o mais esperto

Ginga e fala gíria; gíria não, dialeto

Esse não é mais seu, ó, subiu

Entrei pelo seu rádio, tomei, cê nem viu

Nóis é isso ou aquilo, o quê? Cê não dizia?

Seu filho quer ser preto, há, que ironia

Cola o pôster do 2Pac aí, que tal? Que cê diz?

Sente o negro drama, vai tenta ser feliz

Ei bacana, quem te fez tão bom assim?

O que cê deu, o que cê faz, o que cê fez por mim?

Eu recebi seu tic, quer dizer kit

De esgoto a céu aberto e parede madeirite

De vergonha eu não morri, to firmão, eis-me aqui

Você, não, cê não passa quando o mar vermelho abrir

Eu sou o mano, homem duro, do gueto, Brown, Obá

Aquele louco que não pode errar

Aquele que você odeia amar nesse instante

Pele parda e ouço funk

E de onde vem os diamantes? Da lama

Valeu mãe, negro drama

Drama, drama, drama

Aê, na época dos barracos de pau lá na Pedreira, onde cês tavam?

Que que cês deram por mim? Que que cês fizeram por mim?

Agora tá de olho no dinheiro que eu ganho

Agora tá de olho no carro que eu dirijo

Demorou, eu quero é mais, eu quero até sua alma

Aí, o rap fez eu ser o que sou

Ice Blue, Edy Rock e KL Jay e toda a família

E toda geração que faz o rap

A geração que revolucionou, a geração que vai revolucionar

Anos 90, Século 21, é desse jeito

Aê, você sai do gueto, mas o gueto nunca sai de você, morou irmão?

Cê tá dirigindo um carro

O mundo todo tá de olho em você, morou?

Sabe por quê? Pela sua origem, morou irmão?

É desse jeito que você vive, é o negro drama

Eu não li, eu não assisti

Eu vivo o negro drama, eu sou o negro drama

Eu sou o fruto do negro drama

Aí Dona Ana, sem palavras, a senhora é uma rainha, rainha

Mas aê, se tiver que voltar pra favela

Eu vou voltar de cabeça erguida

Porque assim é que é

Renascendo das cinzas

Firme e forte, guerreiro de fé

Vagabundo nato!


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