Popularizado por bandas como NxZero e Fall Out Boy, o emo é um dos gêneros musicais mais influentes e controversos do rock atual. Rótulos e preconceitos à parte, o G1 preparou uma lista de bandas e discos que ajudam a entender as raízes históricas e musicais do estilo, para além das franjas e maquiagens exibidas por ídolos e fãs. A seleção a seguir pretende mostrar, de forma cronológica, os diferentes significados que o emo já adquiriu ao longo dos anos, partindo das raízes pré-emo e passando também por bandas que influenciaram o gênero, mesmo vindo de um outro background, até os representantes da cena atual. Mesmo que nenhum artista até hoje goste de se associar muito ao gênero, o termo “emo-core”, de onde saiu a abreviação “emo” (de “emocional”) teve lugar e época para nascer: foi cunhado em 1984, em Washington, capital dos EUA, como insulto para as bandas que participavam do movimento conhecido como Revolution Summer. Bandas punks como Rites of Spring e Embrace (de Ian McKaye, que viria a formar o Fugazi) tratavam a esfera pessoal como se fosse política e, dizem, faziam as pessoas chorarem em seus shows, tamanha a intensidade das apresentações. Mas é Andy Greenwald, autor de “Nothing feels good: punk rock, teenagers and emo” (“Nada está bem: punk rock, adolescentes e emo”, em inglês”), quem oferece a definição mais precisa (e sarcástica) do emo, como “talvez, o gênero musical mais adolescente que existe: ultra dramático, inclinado à poesia ruim, transbordando romance e auto-repulsa, acabando antes que você perceba”. Buzzcocks – “Singles going steady” (EMI, 1979) Esta coletânea de singles da banda inglesa (de Manchester, terra do pós-punk depressivo do Joy Division e dos Smiths) traduz bem o universo particular do vocalista e principal compositor da banda, Pete Shelley. Se os Sex Pistols queriam “anarquia no Reino Unido” e o Clash ensejava a revolução a partir de um “chamado de Londres”, Shelley sabia que nunca conseguiria ir a lugar nenhum com seu coração partido. “What do I get” reclama sobre não se ter ninguém para amar, mas as coisas pioram em “Ever fallen in love with someone (you shouldn’t fall in love with)” – quando a própria paixão é o erro e o crime. “Everybody’s happy nowadays” vai além do próprio lamento por ser o único a sofrer de amor no mundo – na verdade, a letra diz, “a vida é uma ilusão, e o amor é um sonho”. É impossível achar algo mais emocionalmente desesperado na geração 77 do punk rock. Hüsker Dü – “Zen arcade” (SST, 1984) Da geração que criou o hardcore norte-americano no começo dos anos 80, o trio de Minneapolis foi o primeiro a abandonar as letras tradicionalmente políticas em favor de uma música que refletisse os anseios e dúvidas pessoais de seus integrantes. “Política vem e vai”, disse o vocalista Bob Mould no lançamento de “Metal circus”, EP que separou a banda do hardcore mais ortodoxo da época. “Mas nós ainda somos humanos, e isso nunca vai mudar, e é sobre isso que queremos cantar.” O Hüsker Dü gravou e mixou sua obra-prima, um álbum duplo, ao longo de meras 85 horas. Uma ópera-punk, “Zen arcade” conta a história de um garoto que sai de casa e tem que enfrentar sozinho um mundo cheio de incertezas. “Broken home, broken heart” trata de problemas familiares, “What´s going on” fala sobre a própria sanidade mental, “Masochism world” fala sobre um mundo doloroso demais para se suportar. A banda ainda iria ter outros grandes momentos, incluindo dois discos lançados pela gravadora Warner. Mas nenhum deles chegou ao nível atingido por “Zen arcade”. Rites of Spring – “End on end” (Dischord, 1986) Washington DC, capital dos EUA, teve uma importante cena hardcore no começo dos anos 1980, graças, especialmente, a Ian McKaye, fundador do selo Dischord e líder da banda Minor Threat. Após o fim da banda, a cena começou a ficar mais violenta e desorganizada. Então McKaye e os seus amigos resolveram criar um novo movimento – que foi rapidamente batizado de Revolution Summer. Um dos pontas-de-lança das novas idéias era o Rites of Spring, comandado por Guy Picciotto. No coração político dos EUA, a banda ia fundo nas próprias emoções – e perguntava, em “Theme”: “Se eu começasse a chorar, você choraria também?”. O Rites of Spring começou a apontar para uma nova dinâmica entre instrumentos, onde a pulsação constante e ritmada do hardcore dava lugar a momentos de silêncio, riffs de guitarra mais espaçados, preocupados com texturas, bateria procurando contratempos e trocando de ritmos. Sobre tudo isso, a voz de Picciotto, desesperado, vomitando os seus piores medos e se expondo sem pudores. A banda fez apenas catorze shows e gravou um álbum e um EP, ambos reunidos na coletânea “End on end”. “Existe alguma beleza nas promessas quebradas?”, pergunta em “Silence / Words away” – nada muito diferente das bandas emo de hoje em dia. Embrace – “Embrace” (Dischord, 1987) Como aconteceu diversas vezes, com diferentes bandas, ao longo da década de 80 no cenário do rock independente norte-americano, o disco de estréia do Embrace só foi lançado depois do fim do grupo. Liderado por Ian McKaye, o Embrace era musicalmente menos abrasivo que o Rites of Spring, mas as letras eram mais diretas. Fundador involuntário do movimento straight edge (que pregava abstinência de drogas e álcool, entre outras coisas) quando era vocalista do Minor Threat, McKaye convocava cada indivíduo da platéia à reflexão sobre suas próprias atitudes. “Suas emoções são nada exceto política/ Então controle-se”, cantava em “No more pain”, listando drogas e atitudes que eram apenas escapes para os adolescentes de uma Washington em declínio social. “Dinheiro não tem nada a ver com o valor da vida”, diz “Money”, “Você se põe à venda/ E então logo se vê esgotado”. Nunca a idéia de vida pessoal enquanto política foi levada tão a sério. Fugazi – 13 songs (Dischord, 1989) Depois de influenciar toda uma geração com o Embrace e o Rites of Spring (numa “primeira onda do emo”, que incluía bandas como Dag Nasty e Nation of Ulysses) Picciotto e McKaye, ao lado do baixista Joe Lally e do baterista Brendan Canty, formaram o Fugazi. Na verdade Picciotto juntou-se à banda depois de formada, após o fim de seu projeto Happy Go Licky. Desta lista, o Fugazi seguramente é uma das bandas menos associadas ao emo (apesar do passado de seus integrantes), mas sua música foi essencial ao influenciar bandas que carregariam o rótulo década de 90 adentro. Incorporando influências do dub via Joe Lally e ainda utilizando as explosões de energia e as letras pessoais dos projetos anteriores, o Fugazi fundiu experimentação com refrões poderosos (“Waiting room”, faixa de abertura desse álbum que junta os dois primeiros EPs da banda, é quase um hino) e abriu caminho para toda uma nova leva de garotos angustiados e suas guitarras inquietas. Jawbreaker – “24 hour revenge therapy” (Tupelo/Communion Records, 1994) O terceiro disco desse trio californiano ajudou a dar cara para tudo que seria rotulado de emo a partir de então – inclusive eles próprios. Produzido por Steve Albini, “24 hour revenge therapy” trouxe um Jawbreaker menos preocupado, mas ainda assim emocionalmente carregado – especialmente depois da cirurgia que o vocalista Blake Schwarzenbach teve que fazer na garganta. O Jawbreaker foi uma das primeiras bandas da “segunda geração” do emo a assinar com uma grande gravadora – no caso, a Geffen, mesma gravadora do Nirvana – fruto da corrida ao ouro que as majors promoveram depois do estouro do rock alternativo nos anos 90 e do fenômeno pop-punk representado pelo Green Day. “24 hour revenge therapy” é mais ensolarado que a maior parte da produção emo da época, mais ainda mantém a aura abrasiva da banda – especialmente no começa-e-pára de músicas como “Outpatient”. Em “Boxcar”, um recado que será ouvido com atenção pelas bandas da próxima década: “Você não é um punk, estou dizendo isso para todo mundo/ Mas você nao precisa responder, eu também nunca fui um”. Sunny Day Real Estate – “Diary” (Sub Pop, 1994) Se existe uma fórmula exata para o emo como o conhecemos, ela está dissertada ao longo do álbum de estréia desta banda de Seattle. Aposta forte da gravadora Sub Pop depois que o furacão das gravadoras arrastou todas as bandas grunge para longe de seus domínios, o Sunny Day Real Estate apostava em melodias circulares (o riff dos versos de “In circles” é um bom exemplo) e na dinâmica de silêncio e barulho que remete tanto ao indie rock do Pixies quanto ao som do Fugazi. Numa época em que emo era apenas um subgênero do punk rock e do indie, o Sunny Day Real Estate conseguiu dar dignidade ao rótulo, com uma produção esmerada num disco de estréia cheio de segredos, segundas vozes, linhas melódicas sobrepostas, peso e, claro, tristeza, choro e ranger de dentes. Dave Ghrol, ex-baterista do Nirvana, ficou tão impressionado que roubou o baixista Nate Mandel para montar seu Foo Fighters – e partes de “In circles”, para compor “My hero”, sua elegia a Kurt Cobain. Weezer – “Pinkerton” (Geffen, 1996) Os fãs brasileiros de Weezer vão chiar e reclamar, mas é impossível traçar uma história recente do emo sem citar o segundo álbum da banda de Rivers Cuomo. Se no “álbum azul”, disco de estréia, o Weezer soava como uma banda de nerds que gostavam de jogar RPG, fingirem ser Buddy Holly e tirar os seus suéteres por aí, em “Pinkerton” a depressão pega de verdade. Rivers Cuomo parece anteceder em cinco anos o tom confessional dos blogs e fotologs da virada do milênio. O que era para ser uma “space opera rock” chamada “Songs from the black hole” transmutou-se durante sua composição e gravação no diário de Cuomo – o cantor está ali, exposto, sem meias-palavras. Ele se apaixona por uma lésbica (“Pink triangle”), se cansa de uma suposta vida sexual desregrada (“Tired of sex”) e tem medo de se apaixonar por uma fã japonesa que ele imagina ser menor de idade (“Across the sea”). Diametralmente oposto ao Sunny Day Real Estate, “Pinkerton” é um disco de dissonâncias e falhas não-intencionais, que só reforçam a imagem humana e imperfeita de Cuomo. The Get Up Kids – “Something to write home about” (Vagrant, 1999) Antes do sucesso do Jimmy Eat World, havia uma curiosidade e uma tensão no ar, quando se tentava imaginar se algum artista da “segunda onda” do emo iria despontar para o mainstream. O Get Up Kids chegou perto disso quando assinou com a Mojo Records – mas foi chutado na seqüência, quando a gravadora foi adquirida pela Universal. O único resultado disso foi o segundo disco da banda, “Something to write home about”, lançado pela Vagrant Records. O sucesso foi tão grande que sozinho ajudou a colocar a Vagrant no mapa das gravadoras independentes norte-americanas, enquanto o Get Up Kids incorporava o tecladista James Deweey e deixava o som ainda mais pop e o clipe de “Action and action” definia toda uma geração de internautas e colocava o iMac na história da MTV. Jimmy Eat World – “Bleed american” (Capitol, 2001) É aqui que começa o emo como fenômeno pop propriamente dito. Na verdade muitos fãs mais aguerridos do gênero dirão que foi exatamente esse disco que matou o emo. Com um som mais pop que o dos dois primeiros discos lançados pela gravadora Capitol, “Bleed american” teve quatro singles entre os Top 20 na categoria rock alternativo nos EUA – incluindo “The middle”, que chegou ao quinto lugar na parada geral. A partir de então, todas as bandas que soariam de alguma forma parecidas com o punk pop do Jimmy Eat World, de Fall Out Boy a Paramore, acabaram ganhando automaticamente o rótulo de emo. É difícil não responder positivamente ao som da banda, especialmente para um adolescente cheio de energia para gastar pulando junto com os refrões assobiáveis da banda. E, no lugar das letras que só falavam da própria tristeza, músicas que davam apoio: “Demora um tempo mesmo, garota/ Você só está no meio do caminho/ Tudo vai ficar bem”, diz “The middle”. Dance of Days – “A história não tem fim” (Teenager In A Box, 2001) A banda paulistana que tirou seu nome de umas das músicas do Embrace é um dos primeiro grupos de emo a surgir no Brasil. Influenciada fortemente pela geração do Sunny Day Real Estate, deixou de lado o hardcore melódico do começo da carreira em favor de letras em português e estruturas musicais menos lineares. “A história não tem fim”, álbum de 2001 lançado pelo selo Teenager In A Box, é como um disco de estréia, e graças ao bom relacionamento da banda com a internet, criou um culto de fãs em todo o Brasil. De cabelos coloridos, piercings e maquiagem, o vocalista Nenê Altro se tornou modelo para os primeiros emos que surgiram no país. Além da instrumentação inédita até então na cena hardcore do Brasil, músicas com títulos como “Flores aos rebeldes que falharam” e “Se estas paredes falassem…” e letras como “Se o vento carregar para longe o seu olhar/ E tocar o céu ser dor maior que perceber que as nuvens de algodão tem marcas de minhas mãos” (“Me leve às estrelas”) tiveram efeito quase messiânico nos adolescentes recém-chegados ao mundo do hardcore. Bright Eyes – “I’m wide awake, it’s morning” (Saddle Creek, 2005) Este posto estaria mais propriamente ocupado pelo herói emo Chris Carraba (Dashboard Confessional) e seu violão, mas seria leviano ignorar uma geração que conquista seu próprio Bob Dylan. Se em “Fevers and mirrors”, Conor Oberst, o ex-garoto prodígio por trás do Bright Eyes ganhou respeito da cena indie e um pequeno culto de adolescentes emos, com “I’m wide awake, it’s morning” ele conquistou respeito de crítica e finalmente teve respaldo de músicos mais “sérios”, como Neil Young e Bruce Springsteen. Fruto da cena de Omaha, que gira em torno do coletivo Saddle Creek, Oberst representa os rumos que os ex-emos vão tomando ao alcançar a maturidade musical e pessoal. Com discos influenciados predominantemente pelo folk e o contry norte-americano, Oberst trata com delicadeza e verve as complexas relações interpessoais do nebuloso novo século. Ou, como diz a letra de “Lua”, maior hit do disco, “O que era tão simples à luz do luar/ Pela manhã nunca o é”. Nx Zero – “Nx Zero” (Arsenal Music, 2006) O álbum homônimo do quinteto paulistano marcou a estréia do emo no mainstream brasileiro. Se o rótulo já havia sido associado timidamente à banda de hardcore melódico CPM 22, no caso do Nx Zero a denominação estava consumada – eles realmente soavam influenciados pelas bandas do gênero que estavam fazendo sucesso nos EUA. Em alta rotação nas rádios de rock e pop e também na MTV com músicas como “Razões e emoções” e “Pela última vez”, o Nx Zero se tornou a versão brasileira do Fall Out Boy. Parcerias com Túlio Dek e Nelly Furtado, namoro com a cantora Pitty, capa da Rolling Stone (onde apareceram nus) – nada parece tirar a banda do sucesso. Consagrando o apelo do gênero no Brasil, a banda ainda faturou três VMB em 2008, além de um prêmio do canal Nickelodeon. No rastro deles, uma nova leva de bandas chega às rádios e ouvidos dos adolescentes. Alguns parecem se encaixar melhor no rótulo emo, como os gaúchos do Fresno, enquanto os mineiros do Strike estão mais próximos do hardcore melódico – assim como os veteranos do Hateen. Fall Out Boy – “Infinity on high” (Island, 2007) Se o Jimmy Eat World significou que o emo passaria a ser pop em termos de vendas, o Fall Out Boy levou o gênero às estrelas – no caso, às celebridades mesmo. Fazendo parcerias com superstars do rap como Kanye West e Timbaland, e sendo produzidos por Babyface (rei do R&B que já produziu Whitney Huston, Mariah Carey, Boyz II Men e Paula Abdul, entre outros), o Fall Out Boy mostrou suas claras intenções gravando uma cover de “Beat it”, um dos maiores sucessos de Michael Jackson. Liderados pelo baixista Pete Wentz – casado com a cantora Ashlee Simpson – o Fall Out Boy (que tem o nome tirado de um episódio do desenho “Os Simpsons”) não abandonou, porém, o tom confessional e, às vezes, de confornto, em suas letras – como atesta “This ain’t a scene, it’s an arms race” (“Isso não é uma cena, é uma corrida armamentista”, em inglês). Isso combina com o fato de eles serem uma das poucas bandas do gênero a receber atenção das revistas de fofoca – em parte graças a episódios como aquele em que foram divulgadas na internet fotos de Wentz nu, tiradas com seu próprio celular.
Você conheceu um pouco mais sobre o Estilo Musical Emocore.
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